quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Transparência tecnológica: uma exigência da softwarização

Em 2011, no Brasil, a lei 12.527 tratou do acesso à informação, sob discurso estribado fortemente na ideia de transparência. Na realidade, entretanto, acrescentou pouco à disciplina processual, toda ela permeada, desde a base, pela publicidade.

É estranho que o legislador, em tão extenso e minucioso documento, não se tenha ocupado das novas tecnologias da informação (TIs), colocando sua incorporação aos mecanismos de adjudicação e aplicação do Direito,  clara e expressamente, sob as luzes da transparência. Nesse especial aspecto, a lei poderia ter efetivamente inovado para o processo, que está sendo invadido por essas tecnologias, mas não o fez.

A softwarização do processo já evidencia, a toda prova, que o software assume papéis antes entregues ao prudente arbítrio do juiz, além de aos servidores. São normas que, em expressão tecnológica, se autoaplicam e dão automaticidade aos sistemas, são as normas tecnológicas(2).

A tecnologia não é um mal a ser espancado. Ela é um bem a ser controlado. E a transparência é um instrumento efetivo para esse controle.

 [...] o software é um invisível permitido, extremamente ativo e que age diretamente, não pela via de outros operadores
E tem de ser assim mesmo, para o bem do processo. Não há porque não ser, embora isso tenha de estar transparente em moldes adequados.
Os jurisdicionados têm direito à transparência tecnológica, não apenas informacional.

Alguns casos já vividos são notórios, como o famoso e recente caso em que um recurso foi considerado intempestivo pelo sistema processual (o software) porque o horário do sistema era o de Brasília e o recurso vinha de um Estado com outra hora.  Outros são corriqueiros, como as muito comentadas rejeições de peças porque não se atendem limites de tamanho que “alguém” incluiu no software por conveniências de ordem administrativa ou financeira. Aliás, numa manobra em que direitos fundamentais são desprezados e prevalecem as tais conveniências. Quem não lembra do Bacenjud, no início, e sua voracidade descontrolada? Isso merece um post à parte!

Na verdade, os processos sempre tiveram atores visíveis e invisíveis. Em legitimação pelo procedimento, da virada dos anos 60 para os 70, ao tratar da autonomia do sistema processual,  Niklas Luhmann[1] já evidenciava a preocupação com os atores invisíveis, presentes no processo via papéis externos dos operadores.   Mas o software é um invisível permitido, extremamente ativo e que age diretamente, não pela via de outros operadores.

Colocá-lo numa zona de luz, sob os olhares de todos, parece uma exigência necessária para desmistificá-lo e para dar validade ao amplo movimento de incorporação das novas tecnologias pelo Direito.



[1] LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento, p. 61-64.  
[2] Sobre a noção de "agente automatizado", nos contornos da tecnologia do workflow, ver o capítulo 2 de  KRAMMES, Alexandre Golin. Workflow em processos judiciais eletrônicos. São Paulo:LTr, 2010.


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