Em 1/12/12, no meu blog Estudos de Direito, publiquei o post em que noticiava a existência de um browser (navegador), disponível para o iPad, capaz de abrir arquivos em flash. Segundo o Juiz Luiz Carlos Roveda, isso permitiria quebrar as restrições do Safari, que não entra sequer na consulta pública (sem certificação digital) do PJe-JT (novo sistema de processo eletrônico da Justiça do Trabalho). [ http://stavarespereira.blogspot.com.br/2012/12/processo-eletronico-e-ipad-novo.html]
Numa primeira mirada, trata-se apenas de uma novidade no âmbito da tecnologia. Será?
Na verdade, pensando-se com mais vagar, parece ficar claro que a norma tecnológica posta em operação (o sistema processual a incorporou desta forma) impõe meios específicos pelos quais os atos processuais podem ser cumpridos. Ou não? O exercício de direitos processuais fundamentais está atrelado (subordinado) ao cumprimento de determinadas regras que, na sua versão tecnológica, são diferentes da norma prima facie (textual).
Explico melhor: o CPC prevê a possibilidade de um recurso, por exemplo, num determinado prazo. Sempre tivemos "formas" para o exercício desse direito, definidas em lei, além da delimitação de conteúdos: requisitos intrínsecos e extrínsecos. E, portanto, não há novidade na existência de condições para exercitar o direito de recorrer. Normas e princípios combinam-se, de forma harmônica, na construção do "mecanismo recursal".
Com o sistema processual eletrônico, isso se transformou. Somente a via "eletrônica" passou a ser aceita. Portanto, na passagem do processo em papel para o "processo eletrônico", novos condicionantes do exercício do direito de recorrer apareceram, portanto. O mais evidente, e necessário, é o uso de meios eletrônicos.
Está errado isso? Parece que a resposta tende a ser um veemente não, embora possa haver muitos questionamentos a respeito, por exemplo, da velocidade da implementação das exigências (imposição de formas em detrimento da substância), da inexistência de infraestrutura uniforme, em todo o território, para o exercício de direito fundamental (isonomia) etc. Essa discussão, entretanto, não atine diretamente à expressão tecnológica das normas postas (às normas tecnológicas). Não são inconvenientes que defluem da maneira como se escreveram (codificaram tecnologicamente) as normas legais do regramento recursal.
Mas, indo ao ponto:
A lei previu a evolução, claramente, para o uso de meios eletrônicos. Uma leitura da lei 11.419/2006 permite vê-la como uma ampla autorização para tal transformação processual. Isso se espraia ao longo do texto legal, por inúmeros dispositivos. O art. 10 é um excelente exemplo.
No entanto, o arcabouço normativo da lei 11.419/2006, ao ganhar expressão tecnológica (ser escrito em linguagem técnica e transformar-se num sistema), parece ter avançado em relação às restrições/previsões legais.
Esta norma exigiu, para sua implementação, "decisões e escolhas". Foram decisões e escolhas que nortearam, e vem norteando, vultuosos investimentos públicos e, só por isso, são importantes. Mas isso implicou, também, escolha de certas "expressões tecnológicas" (digamos assim!) e não de outras. O iPAD, por exemplo, está banido desse caminho. Nem gosto dele, mas trata-se de um bom exemplo para chamar a atenção para a categoria científica norma tecnológica.
Essas e outras decisões, tomadas ao longo da construção dos sistemas eletrônicos processuais, se incorporam ao arcabouço legal processual, transformando-o. No momento em que tal arcabouço ganha expressão tecnológica, ou seja, exprime-se em normas tecnológicas, não há uma inócua "tradução" normativa. Muito pelo contrário!
A norma tecnológica é diferenciada, única, tem sua própria expressão e seu modo de operação. Por isso é uma categoria científica nova, que está a exigir teorização e normatização.
Não se trata, aqui, de ser contra ou a favor de nada, mas de destacar que, quando um regramento legal se exprime tecnologicamente, ele concretiza a previsão legal de certo modo, ou seja, a norma tecnológica distingue-se, em extensão e compreensão, da norma legal textual cuja implementação ela busca.
Os advogados, com seus iPads, devem ter muitos outros exemplos similares.
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